Ubiraci Espinelli (Foto: Arquivo pessoal)

COMO AUMENTAR A
PRODUTIVIDADE NA CONSTRUÇÃO


Ubiraci Espinelli, professor do Departamento de Construção Civil da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli/USP) e diretor da Produtime Gestão e Tecnologia e da Indicon, afirma que o gestor tem um papel fundamental na produtividade e que as pequenas empresas podem se beneficiar de parcerias com as grandes. A Indicon tem a Caixa Econômica Federal como um dos seus principais clientes e atua no cálculo do Sinapi (Sistema Nacional de Preço dos Insumos) de uma obra. Convidado do Rio Construção Summit (RSC), Espinelli concedeu esta entrevista exclusiva para a Carta da Indústria. No evento, de 19 a 21/09, no Píer Mauá, no Rio de Janeiro, ele vai falar sobre “Melhoria da Produtividade na Construção Civil: Um desafio do setor”, na quarta-feira, dia 20. “A industrialização é um caminho para a melhoria da eficiência, mas não é uma coisa mágica”, afirma ele, em uma de suas considerações sobre o tema. 


CI: Qual a sua avaliação do setor da construção hoje no Brasil quanto aos indicadores de produtividade?

Ubiraci Espinelli: Quando a gente fala de produtividade, tem um primeiro aspecto: ela varia muito de uma empresa para outra, de um canteiro de obras para outro e, dentro de um canteiro, de um serviço para outro. Encontramos situações de produtividade melhor ou pior em construtoras grandes e pequenas. As grandes costumam trabalhar com várias empreiteiras, que são as pequenas. Dentro de uma mesma obra, há alguns serviços sendo feitos com eficiência muito boa e outros nem tanto. Às vezes, numa construtora pequena, você perde pela capacidade de investimento, mas ganha pela provável maior proximidade do gestor em relação aos comandados.

 

CI: Como melhorar a produtividade da mão de obra? Isso passa também pela qualificação dos gestores?

Ubiraci Espinelli: Claro que precisa melhorar a qualificação do operário, mas isso também é uma tarefa do gestor. É ele que deve ter essa percepção e providenciar isso internamente ou cobrar dos órgãos que dão treinamento para melhorar essa mão de obra disponível. Já analisei a produtividade de sete estados; entre eles, São Paulo, Rio de Janeiro e Acre. Quando damos ao operário as mesmas condições em produto, processo e organização, trabalhamos com a mesma produtividade. Isso vale para o Brasil e para outros países. Fui vice-coordenador de um estudo Internacional que comparava produtividades nos Estados Unidos, México, Brasil, Croácia, Inglaterra e Austrália. Percebemos que o norte-americano não era melhor do que o brasileiro. Se der uma condição favorável para esse americano trabalhar, ele vai ter uma produtividade melhor; mas, se der uma condição mais favorável para o brasileiro, ele vai ser melhor. A gente encontra dificuldades de organização do trabalho em todos os países. A pegada do Rio Construção Summit é a produtividade no uso dos recursos: mão de obra, materiais e equipamentos. 

 

CI: O que é possível mudar para melhorar a produtividade?

Ubiraci Espinelli: Podemos mudar o produto. Nos edifícios, podemos ter uma arquitetura que privilegie a eficiência na produção. Obras totalmente cheias de detalhes podem ser justificadas por conta de um desempenho estético ou quanto à acústica ou a um padrão melhor. Tem um monte de coisas que eu posso fazer no nível de edificação que torna a obra mais difícil ou mais fácil. Ao olhar para um projeto de arquitetura, de estruturas, a gente pode dar sugestões ao projetista ou a um arquiteto que facilitem a execução do trabalho. Tenho que fazer um tamanho de parede coerente com o tamanho do bloco que vou inserir nela. Toda vez que eu não faço isso, tenho que ajustar e atrapalha a execução. Não é culpa do operário. No produto entram situações do tipo: moldar a peça in loco, ou pré-fabricá-la. Toda vez que pré-fabrico, tiro a mão de obra do canteiro. E provavelmente faço com mais eficiência numa central, que pode ser na própria obra, e chamamos de pré-moldagem. Pode ser fora do canteiro, que é a pré-fabricação.

 

CI: A industrialização no sentido da pré-fabricação é um caminho para melhorar a produtividade da mão de obra?

Ubiraci Espinelli: Sim. Tem que ser o conjunto de três coisas: a mais básica é organização; a segunda, a mecanização; e a terceira, ter os componentes pré-fabricados. Ter só pré-fabricados, sem a mecanização necessária, sem organização do trabalho, pode ser uma catástrofe maior do que usar um sistema menos industrializado organizado. Industrialização tem que vir nesse sentido. Se colocar pré-fabricados para fazer a obra e não tiver equipamento de transporte suficiente, a obra vai andar devagar.

 

CI: E tem que preparar o canteiro de obra para receber os pré-fabricados?

Ubiraci Espinelli: É preciso preparar o canteiro de obras, ter os equipamentos, os locais para depositar ou imediatamente fazer a montagem. A industrialização é um caminho para a melhoria da eficiência, mas não é uma coisa mágica. É todo um processo que tem como raiz a organização. Quando organizo o meu processo, crio a mecanização; por exemplo, para movimentar os materiais e depois usar os pré-fabricados. Vou fazer revestimento de argamassa, posso comprar cimento, cal, areia, dosar e misturar na obra. Aí o operário pega a argamassa e arremessa contra a parede com uma colher. Não é errado. Mas há um outro processo em que tenho um silo de argamassa, uma bomba que leva essa argamassa seca até o andar, um outro equipamento que a mistura com água e que está conectado numa mangueira que chega até o operário. Na hora em que ele aperta o gatilho, sai a argamassa. Assim, eu eliminei muita mão de obra. Quanto mais industrializado, melhor a qualidade. É mais uniforme. Mas tem uma questão de custo. O produto mais industrializado pode custar mais em material, mas, em relação ao conjunto, pode custar menos. Essa é uma conta para as empresas verem se podem avançar em termos de industrialização.

 

CI: O que é uma anormalidade no processo de construção?

Ubiraci Espinelli: Mesmo com o melhor produto do mercado, o projeto superbom e o processo bem pensado, pode ocorrer de o fornecedor não entregar o material. É uma anormalidade. Há anormalidades que estão mais na mão do gestor. Essa, por exemplo, seria culpa só do fornecedor? Se era tão importante, o gestor deveria ter um estoque de material. Em outro exemplo: estou revestindo a fachada e está chovendo o dia inteiro. Não vou poder trabalhar, é outra anormalidade.

 

CI: Onde é que entra a digitalização? 

Ubiraci Espinelli: Com a digitalização, a comunicação fica mais fácil. O registro digital e depois a troca de informações facilitam a organização do processo e evitam a falta de material. Agora, o efeito direto da digitalização está na produtividade das outras pessoas que dão apoio à produção, mas não são efetivamente da produção. Toda vez que entramos em processos com mais tecnologia, estamos, provavelmente, facilitando o trabalho do projeto de suprimentos etc., que é importante para a empresa, mas não é a produtividade da execução. Indiretamente pode afetar a produção à medida que tornamos as anormalidades menos prováveis de acontecer. As anormalidades do tipo faltar material, informação, frente de trabalho é que são importantes. Combater anormalidades é o primeiro dever de um gestor. Depois, ele tem que trabalhar no projeto do processo, do produto. O gestor é a pessoa-chave.

 

CI: O que haveria de determinante para a produtividade? Você diria que seria o papel do gestor?

Ubiraci Espinelli: O papel do gestor é o número 1, mas tem várias outras coisas importantes. Quem defende a industrialização, como eu, não acredita que nas obras tem que ser tudo pré-fabricado, nem de um fornecedor só. Mas também têm outras variantes como o tipo da taxação que a empresa paga. Os industrializados não recebem um tratamento que facilite a implementação desse processo. Isso tem que melhorar. Mas têm que melhorar também os projetos, processos e a organização do trabalho. É preciso um bom gestor para isso.

 

CI: O que o gestor deve fazer para perseguir essa melhoria da produtividade. Ele próprio se capacitar?

Ubiraci Espinelli: Ele tem que se capacitar. Houve um período muito grande na construção em que o gestor virou um representante da construtora. Cuidava do dinheiro da empresa, virou um negociador. Na hora de contratar um serviço orçado em R$ 100 mil, brigava para pagar R$ 70 mil. Isso é muito pouco para um gestor, que precisa conhecer, entender a eficiência na produção e tomar decisões coerentes. Ele pode, com certeza, negociar, mas não como um simples negociador. Nos últimos anos, a construção tem resgatado esse papel do gestor, de alguém que entende de tecnologia, mas principalmente da organização do trabalho. Há construtoras no Brasil muito boas que não perdem para as de países de primeira linha.

 

CI: Uma boa gestão é então o diferencial dessas construtoras?

Ubiraci Espinelli: Essas boas empresas têm boa gestão e possuem também equipamentos que fazem muita diferença no canteiro de obras, por exemplo, para movimentar materiais. Um estudo mostra que um operário executa um serviço durante 1/3 do tempo em que está presente na obra. Durante um outro 1/3, faz movimentação de material. E no outro 1/3, está ocioso. O trabalho em construção é pesado, você precisa descansar um pouco. Faz parte dos processos de produção. O gestor também é o gerente de obra, o gerente geral, além de um diretor técnico. Eles podem tomar decisões de escolha de projeto de produto.

 

CI: Existem algumas ferramentas de gestão. Essa capacitação nas ferramentas faz diferença para o gestor?

Ubiraci Espinelli: Há várias ferramentas no mercado que ajudam a fazer a gestão, na medida em que facilitam o registro de informações. É ruim ir a campo, anotar num papel, digitar em outro lugar, depois repassar. Isso é perda de produtividade. Essas ferramentas ajudam muito diretamente os gestores imediatos, o encarregado, o mestre, o engenheiro da obra e o back office, o pessoal de suprimentos, de orçamento, de controle de projetos. E indiretamente ajudam a produção porque o gestor terá informações melhores e mais rápidas; com isso, ele aumenta a sua capacidade de tomar as decisões para melhorar a produtividade na produção.

 

CI: E as ferramentas de transformação digital, como o BIM, o acompanhamento e monitoramento remoto das obras? Como as empresas de menor porte podem se digitalizar?

Ubiraci Espinelli: Essas ferramentas sempre passam por um processo de melhoria. Surgem como uma ideia maravilhosa, mas na implantação aparece uma série de dificuldades. As empresas menores têm menor capacidade de investimento. Por outro lado, o mundo dos prestadores de serviço das grandes empresas é constituído por empresas pequenas. As grandes podem cumprir um papel de disseminar o conhecimento para as pequenas. Essa visão de “ganha-ganha” é fundamental para a produtividade. Essas ações conjuntas levam a ganhos das várias partes. Há instituições, como a Firjan, que realizam uma série de ações de treinamento para disseminar o conhecimento.

 

CI: Eventos como o Rio Construção Summit, que o Sinduscon-Rio promove com apoio da Firjan, em setembro, cumprem um papel de ajudar a disseminar o conhecimento para as pequenas empresas?

Ubiraci Espinelli: Sim. É uma obrigação também do gestor estar antenado e detectar quais são as oportunidades. Isso é do profissional do segundo milênio. Eventos como o Rio Construção Summit favorecem a percepção de oportunidades. É superimportante as pessoas estarem presentes. O público talvez seja diverso, com empresas menores, maiores, mas essas boas soluções podem caber para os grandes e para os pequenos. As lições valem para todos.

 

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