Ana Toni, diretora-executiva da COP30

COP30: INDÚSTRIA E
FLORESTA EM FOCO


Avaliar o quanto é necessário avançar para alcançar acordos ambientais internacionais é a missão primordial da COP30 no Brasil, considerada a conferência da implementação. Na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025 (COP30), que será entre 10 e 21 de novembro, em Belém, no Pará, o Brasil vai defender a adaptação e a resiliência, mostrar o quanto a indústria brasileira tem contribuído para a descarbonização, a importância de prover prosperidade para quem depende da floresta, além de apresentar o potencial da América Latina como uma região-chave para enfrentar as mudanças do clima.

 

Esse olhar ampliado sobre a COP no Brasil foi dado por Ana Toni, diretora-executiva da COP30 e secretária nacional de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente, nesta entrevista exclusiva à Carta da Indústria.  

 

Carta da Indústria:  A Conferência do Clima, em Belém, deve tratar sobre vários temas que envolvem negociações internacionais. Um deles é a transição para fontes de energia renováveis e a redução da dependência de combustíveis fósseis. Quais as perspectivas de avanço nessa questão?  

Ana Toni: Essa é uma COP de implementação. Então, o que precisa ser feito, não só no tema de energia, mas também nos outros que estão sendo debatidos, como florestas e reflorestamento, é avaliar qual é o próximo passo para a implementação.  

 

O primeiro passo é cada país apresentar a sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) – documento preparado no contexto do Acordo de Paris, descrevendo metas e ações para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e adaptar-se às mudanças climáticas. Já fizemos a nossa NDC e podemos dizer que o Brasil está contribuindo para esse objetivo global.  

 

CI: E depois disso?

Ana Toni: Analisar, juntamente com os negociadores, se o que os países estão fazendo é suficiente. Ou se tem alguma medida internacional que precisaríamos fazer para acelerar os objetivos de energia. Podemos citar que os grandes objetivos, acordados na COP28, são triplicar a energia renovável, duplicar a eficiência energética, transitar para o fim de combustíveis fósseis de maneira ordenada e diminuir os subsídios aos combustíveis fósseis.  

 

CI: Como estão as negociações referentes à revisão e à ampliação dos compromissos de redução de emissões de gases de efeito estufa?  

Ana Toni: Não tem uma negociação sobre redução para os gases de efeito estufa. Os objetivos globais visam limitar o aquecimento global a 1,5 grau ou 2 graus. É importante ressaltar que a implementação depende muito do que cada país decide da sua própria maneira de implementar. A análise coletiva é para constatar se podemos fazer mais ou não. Mas não há um acordo que obrigue os países a fazer desse ou daquele jeito.  

 

Diretora-executiva da COP30
Ana Toni fala sobre os desafios da COP 30 em Belém (Foto: Presidência da COP30)

 

CI: E qual é a expectativa em relação a essa entrega?  

Ana Toni: A expectativa é que todos os países membros do Acordo de Paris entreguem as suas metas nacionais na COP. O Brasil foi um dos primeiros, entregou na última reunião, em novembro do ano passado. Até hoje só 20 ou 25 países entregaram. Precisamos que as 198 nações apresentem suas metas para realizarmos o relatório síntese, que vai determinar quão longe estamos da meta global. A partir disso, a negociação vai refletir se precisamos fazer mais e o que mais precisamos fazer.  

 

CI: Qual a importância das indústrias nessa questão da redução das emissões? Há avanços nesse sentido no Brasil?  

Ana Toni: A maioria das emissões globais de gases de efeito estufa vem de energia e de indústria, principalmente as de países desenvolvidos. No caso brasileiro, a maioria da nossa emissão vem do uso da terra, do desmatamento. A indústria brasileira tem sido menos pressionada do que as globais no tema descarbonização porque o Brasil tem uma matriz de emissão diferente do resto do mundo, mas ainda assim as empresas têm dado passos muito importantes. Principalmente porque muitas delas dependem do mercado internacional, que vem obrigando as indústrias a buscarem a descarbonização.  

 

A indústria brasileira tem contribuído, mas pode contribuir mais, principalmente as que dependem de combustível fóssil. Essas têm agilizado ainda mais a sua descarbonização. As indústrias estão muito conscientes do seu papel, da necessidade de descarbonizar e têm participado ativamente do plano do clima nacional.  

 

CI: Como os países estão se posicionando sobre a preparação e o enfrentamento dos impactos das mudanças climáticas, com eventos extremos?  

Ana Toni: Em 2024, primeiro ano em que o aquecimento global ultrapassou 1,5 grau, vimos o que aconteceu no mundo: enchentes, secas e incêndios. A mudança do clima chegou de maneira muito forte, causando muita devastação. Temos não só que mitigar, mas também nos adaptarmos à mudança, que vai influenciar, por exemplo, o agronegócio brasileiro e a capacidade de energia elétrica das hidrelétricas. Todos os países têm consciência de que a resiliência e a adaptação têm que ter outro nível de prioridade, e vamos fazer com que a COP30 priorize esse tema.  

 

CI: O que poderia ser feito para evitar o desmatamento ilegal e promover práticas sustentáveis de manejo florestal, com foco na importância da Amazônia e outras florestas na regulação do clima e na manutenção da biodiversidade?  

Ana Toni: A maior emissão brasileira, como falei, vem do desmatamento. Então isso tem sido priorizado no governo federal, o que resultou no declínio desse tipo de agressão ambiental. Desde 2023 vimos uma queda muito grande no desmatamento no Brasil.  

 

Além disso, queremos fazer de “finanças da natureza”, um tema importante na COP 30. O objetivo é prover capacidade e prosperidade para as pessoas que dependem da floresta, para que elas tenham alternativas para não precisar desmatar. Então, é preciso remunerar, por exemplo, os indígenas, os ribeirinhos ou até fazendeiros que têm mais do que a reserva legal, para que eles não fiquem estimulados a desmatar.  

 

Queremos dar visibilidade a instrumentos econômicos que o Brasil já tem, como o Fundo Floresta Tropical para Sempre - para remunerar países em desenvolvimento que conservam suas florestas tropicais. O caminho é combater a ilegalidade e remunerar quem está cuidando da floresta.  

 

CI: Outro ponto que será discutido na COP30 é o financiamento climático, com foco na necessidade de países desenvolvidos apoiarem financeiramente os em desenvolvimento.

Ana Toni: A nossa COP vai discutir a mobilização de US$ 1,3 trilhão para o financiamento climático. Foi acordado e pedido para a Presidência da COP sugerir maneiras de os países desenvolvidos – os que mais poluíram e causaram os gases de efeito estufa - liderarem essa mobilização de recursos.  

 

Os US$ 300 bilhões que os países ricos se comprometeram, na última reunião, a transferir por ano para os países em desenvolvimento a partir de 2026, são bem-vindos, mas ainda é muito pouco. Doar não é caridade, é responsabilidade, porque os países desenvolvidos são grandes responsáveis pela mudança no clima. E, se não tivermos recurso, não vamos poder contribuir de maneira acelerada.  

 

CI: Fale mais sobre sua declaração de que a América Latina é uma região chave para enfrentar as mudanças do clima e acelerar a implementação dos planos e acordos internacionais ambientais.

Ana Toni: Na América Latina, existe abundância de recursos naturais, como florestas, minerais e fontes renováveis. No Brasil, são hidrelétrica e energia solar. Então, podemos ser provedores de soluções climáticas. Mas a região também é muito vulnerável à mudança do clima, com grandes secas e inundações. Dessa forma, há interesse em que a agenda climática ande, beneficiando-se com uma economia de baixo carbono e muitos recursos naturais.  Por fim, a região sempre defendeu o multilateralismo e a ação coletiva.

 

CI: Qual a mensagem que você gostaria de deixar neste momento?  

Ana Toni: Primeiramente, agradeço o trabalho de conscientização que a Firjan está fazendo. Obviamente, as COPs são fundamentais, mas a ação climática tem que acontecer todos os dias. Todas as empresas podem e devem fazer valer a ação climática todos os dias, não precisa esperar uma COP. Debates e entrevistas têm que acontecer sempre, porque o combate à mudança do clima é algo que tem que acontecer no dia a dia das pessoas, nas decisões de cada CEO, de cada consumidor, de cada jornalista, de cada mãe. É uma decisão de todos e vai depender de todos para que se consiga fazer esse enfrentamento.