Presidente da concessionária Águas do Rio Alexandre Bianchini

O FUTURO DAS ÁGUAS
E DO SANEAMENTO


“O cliente quer água em quantidade, de qualidade e a preço justo”, afirma Alexandre Bianchini, presidente da concessionária Águas do Rio, responsável pelo abastecimento de água e esgotamento sanitário em 27 municípios do estado do Rio de Janeiro, incluindo 124 bairros da capital, atendendo 10 milhões de pessoas. Bianchini é engenheiro civil com MBA em Gestão de Negócios pela FGV, com sólida experiência na área de saneamento básico. Ele atua desde 2018 no grupo Aegea, ao qual pertence a Águas do Rio. Nesta entrevista exclusiva para a Carta da Indústria, Bianchini reflete sobre os resultados dos quase dois anos de concessão e também quais são os próximos passos do ousado plano: realizar o maior investimento em saneamento básico no país, em torno de R$ 39 bilhões. O executivo, inclusive, é um dos debatedores confirmados do evento Rio Construção Summit, em 20/9, no Pier Mauá. 

 

CI: Qual o balanço que você faz dos resultados alcançados, até o momento, pela Águas do Rio em quase dois anos de concessão?

Alexandre Bianchini:  A gente, desde que assumiu, tinha um planejamento que focava em água e esgoto. Na Baixada Fluminense, havia muita coisa implantada e deteriorada. Tínhamos que recuperar as estruturas existentes. Instalamos mais de 250 km de rede na região, o que levou água para mais de 300 mil pessoas, que sequer tinham acesso a água tratada. O déficit era muito grande, dos 10 milhões de habitantes na área da nossa concessão, 1 milhão tinham abastecimento muito ruim ou inexistente. As elevatórias foram todas reformadas, os reservatórios que não estavam em operação foram ativados. Alguns trechos de adutoras foram substituídos e as redes, ampliadas.

 

C.I: E em relação a esgoto?

Alexandre Bianchini: Recuperamos todas as sete grandes estações de tratamento, inclusive a Estação Alegria, que é a maior da América Latina. As redes coletoras estão sendo recuperadas.  A Estação Alegria dobrou sua capacidade de tratamento de esgoto. O interceptor oceânico, um grande túnel que sai do Aeroporto Santos Dumont e vai até o Posto 5, em Copacabana, estava com 70% da sua capacidade coberta por lixo. Retiramos duas mil toneladas de lixo. Assim, todos os corpos hídricos passaram a cair dentro dele e levados para o emissário submarino. Além disso, hoje já evitamos língua negra na praia em dia de chuva de até 50 milímetros. Com isso, as praias de Botafogo, da Ilha do Governador e de Paquetá vêm dando sinais de balneabilidade. 

 

CI: Quais as ações para a Lagoa Rodrigo de Freitas?

Alexandre Bianchini: Quando assumimos, caía esgoto direto na Lagoa. Recuperamos todo o sistema em torno dela, trocamos 1 km de rede de captação, reformamos todas as elevatórias que ficam a sua margem. Fizemos um convênio com o biólogo Mário Moscatelli para recuperar o mangue em torno da Lagoa. E hoje vemos a mudança: a água ficou transparente, propícia à pesca e ao mergulho. A fauna voltou pra lá.

 

CI: Os consumidores industriais também vão ser beneficiados, de que forma? 

Alexandre Bianchini: O recurso hídrico é limitado. Só temos o Rio Paraíba do Sul. Para o setor industrial, já iniciamos um grande programa de água de reúso. Aproveitar a água, o esgoto tratado, para usar em processos industriais. Não precisa ser água potável, para resfriar um ar-condicionado, e a gente consegue hoje tornar a água de saída do tratamento de esgoto adequável para a condição de qualquer indústria, com as especificações que elas precisam. O programa está em evolução, já estamos discutindo inclusive com a Petrobras. Vamos preservar água para consumo humano, e para as indústrias, usar o máximo possível de reúso.

 

CI: O que tem sido feito para as comunidades? 

Alexandre Bianchini: As 525 comunidades da cidade do Rio de Janeiro e as 700 em geral têm acesso a programas como o “Vem com a gente”, que resolve os problemas de água e esgoto e implanta a tarifa social, à qual menos de 1% da população tinha acesso. Hoje estamos com 18%. O cliente quer água em quantidade, qualidade e a preço justo. Contratamos 4,5 mil funcionários diretamente em comunidades. Recebem treinamento, todos os benefícios e trabalham perto de casa. Isso estimula muito a produzirem bem.

 

CI: Houve um reajuste de tarifas?

Alexandre Bianchini: Não, são as mesmas da Cedae. Estamos trocando os hidrômetros da cidade que não estavam marcando da forma correta. Com os medidores novos, houve a medida correta do consumo e aí a conta aumentou. As pessoas percebem que estão consumindo mais do que deviam e começam a combater vazamentos e a tomar banhos mais curtos. Houve um ruído no início de que as contas aumentaram. Mas não foi isso.

 

CI: Qual a estratégia da Águas do Rio para os próximos 5 anos?

Alexandre Bianchini: Nós temos uma série de metas a cumprir, a principal é fazer o coletor em torno da Baía de Guanabara, que já recebemos a licença ambiental. Na Lagoa de Araruama, esse sistema foi implantado e a lagoa está com a água transparente, impulsionando pesca e turismo. O projeto da Lagoa Rodrigo de Freitas é idêntico, assim como o da Baía de Guanabara. As obras começam este ano na Baía e terminam em 5 anos. Os resultados começam a aparecer com a instalação dos coletores. É uma dupla proteção: a rede coletora de esgoto, e a segunda rede que evita que o esgoto na água pluvial atinja o meio ambiente. Isso trará retorno em turismo, renda, emprego e valorização imobiliária. Nos primeiros cinco anos, vamos investir R$ 9,6 bilhões.

 

CI: E as próximas metas?

Alexandre Bianchini: Vamos investir cerca de R$ 39 bilhões durante a concessão de 35 anos. Até 12 anos, temos que universalizar o sistema de abastecimento de água e garantir 90% do esgoto tratado, com investimento de R$ 24,4 bilhões, em alinhamento ao novo Marco Regulatório do Saneamento. O Rio de Janeiro é o estado mais preparado para atingir esse objetivo. 

 

CI: Qual a expectativa de ampliação do faturamento da concessionária à medida que os serviços estão sendo expandidos para outros territórios?

Alexandre Bianchini: Temos duas grandes frentes: medir da maneira correta e evitar as perdas. No Rio, as perdas são acima de 50%. Temos que consertar vazamentos, lutar contra a submedição e combater as ligações clandestinas, que não são apenas em comunidades. As piores estão na Zona Sul. Quando esse trabalho é feito, temos melhora do faturamento a partir de preço justo para todos. Instalamos hidrômetros de grande precisão para os grandes consumidores. Se o consumo disparar, avisamos a eles.   

 

CI: Como o abastecimento de água potável e o saneamento se relacionam com a dignidade humana?

Alexandre Bianchini: Das doenças, 70% têm origem hídrica, e 30% das crianças internadas no Rio são por falta de saneamento. Talvez o primeiro ser humano tenha morrido por falta de saneamento e ainda é um assunto renegado a segundo plano. Eu já ouvi reportagens de que 38 milhões de pessoas não têm acesso à internet. Mas 35 milhões não têm acesso a água tratada. Apenas 25% da população têm acesso ao ciclo completo. Estamos falando de mortalidade infantil. Todos nós já tivemos uma doença de origem hídrica. Se não investir fortemente nesse quesito, não recupera. A melhor forma de contornar a superlotação de hospitais é trabalhando no saneamento. O resultado é quase imediato. O abastecimento de água gera mais ansiedade na população. Precisamos levar mais água para a Baixada, para melhorar o abastecimento lá. Estamos usando um satélite israelense para identificar vazamentos internos e já eliminamos 180 vazamntos. Com isso, reduzimos a quantidade de água para as Zonas Sul e Norte e jogamos para a Baixada.  

 

CI: Quais ensinamentos foram aprendidos na operação no Rio de Janeiro?

Alexandre Bianchini: O aprendizado é contínuo. Operamos em diversas cidades do país. Apesar de a gente ter estudado bastante, algumas coisas tivemos que adaptar. Um desafio que vencemos foi o trabalho em comunidades. Pelo programa Afluentes, 5 mil líderes comunitários têm o WhatsApp da empresa para solicitar serviços. Ficam equipes na região para atender as comunidades. Com isso, na Barreira do Vasco, a inadimplência é menor que a da Zona Sul do Rio.