Publicado em 29/10/2024 - Atualizado em 29/10/2024 10:45
LIDERANÇA FEMININA
NO SETOR DA CONSTRUÇÃO
Aos 38 anos de idade, Sheyla Resende é a primeira mulher CEO da Gafisa e uma das poucas executivas no setor da construção no país, fatia tradicionalmente ocupada por homens. Em entrevista exclusiva à Carta da Indústria, a engenheira civil de formação faz questão de ressaltar que atuar na liderança é fazer parte de uma nova realidade e ser voz e exemplo para muitas pessoas.
Promovida durante a gestação de seu segundo filho, a executiva destaca que a realização na vida social e pessoal dá fôlego para mais dinamismo e foco na vida profissional. E avalia que comprometimento e dedicação, somados a capacitação, repertório, conhecimento e boas habilidades emocionais são fatores importantes para se alcançar uma posição de destaque em uma grande empresa.
A CEO, que começou na Gafisa como trainee, ressalta que hoje 45% dos cargos de liderança da empresa septuagenária são ocupados por mulheres.
CI: Como se sente sendo a primeira mulher CEO da Gafisa durante os 70 anos de atuação da empresa, num setor predominantemente masculino?
Sheyla Resende: Estar na posição de CEO, após 15 anos de atuação na companhia, é um reconhecimento do qual me orgulho muito. Atuar na liderança de uma empresa de incorporação e construção civil é fazer parte de uma nova realidade e ser voz e exemplo para muitas pessoas, considerando que, em um passado não tão distante, o setor era predominantemente dirigido por homens e atualmente vem se transformando.
A Gafisa é uma empresa com 70 anos de história e hoje 45% dos cargos de liderança (coordenadores, gerentes) são ocupados por mulheres e 33% de cargos da alta liderança (diretores) também, com alta representatividade, como cargos de diretoria de engenharia nacional e controladoria.
Eu acredito que o estudo e a capacitação são fundamentais e incentivo todas as pessoas a serem as protagonistas das suas carreiras. É uma honra inspirar outras mulheres a seguirem suas trajetórias de sucesso.
CI: Quais os pré-requisitos, ou atributos, para alcançar uma posição de destaque em uma grande empresa?
Sheyla Resende: Comprometimento e dedicação somados a capacitação, repertório, conhecimento e boas habilidades emocionais são fatores importantes. O que me impulsionou em minha carreira foram diversos desses atributos, resiliência e amadurecimento profissional. Além disso, é importante mencionar também a relevância dos momentos de curva de oportunidade na empresa.
CI: Você foi promovida quando estava grávida. A maternidade pode ser um impedimento para a mulher avançar na carreira?
Sheyla Resende: Fui promovida quando estava grávida do meu segundo filho. Estar realizada na vida social e pessoal nos dá fôlego para ter ainda mais dinamismo e foco na vida profissional. A partir do momento em que nos preparamos para a maternidade, passamos a ter um horizonte maior; aumenta nosso compromisso e responsabilidade e um olhar mais assertivo na gestão do tempo.
CI: Em 2023, a estratégia da empresa era investir em produtos de altíssimo padrão. Como você avalia essa estratégia hoje e para os próximos anos?
Sheyla Resende: A qualidade é algo que faz parte do DNA da empresa, que é reconhecida como referência no mercado. A decisão de negócio de atuação dedicada somente ao alto padrão vem desde 2021 e estamos confiantes nessa estratégia e modelo de negócio, que vem nos rendendo muito aprendizado, capilaridade, alcance de novos formatos de negócios e resultados financeiros e vendas assertivas, que demonstram a correta direção da empresa.
Além disso, temos o cliente no centro do negócio e estamos sempre dispostos a aprender. Estudamos vários tipos de mercado, que não se limitam somente ao imobiliário, e utilizamos desse repertório para desenvolvermos e adaptarmos estratégias e planos de melhoria.
CI: Como você avalia o setor da construção hoje? Quais as perspectivas para o futuro, o que deve mudar? Quais as principais barreiras ao avanço do setor, na sua opinião?
Sheyla Resende: O setor da construção passa por um momento de transformação. A demanda por alta qualidade e design exclusivo continua a crescer, especialmente em localizações privilegiadas. Por outro lado, o setor enfrenta desafios, como a escassez de materiais e profissionais, além das flutuações de custos e juros, que podem impactar prazos e orçamentos. Neste momento são aliados a sustentabilidade e as tecnologias, que apoiam em construções ecoeficientes e inovações, como a automação e o uso de inteligência artificial.
Estamos nos adaptando a essas tendências, priorizando a qualidade e a experiência do cliente, além de garantir que nossos projetos sejam únicos em uma proposta muito próxima da artesanal para a concepção dos nossos produtos. O setor da construção no Brasil tem muito potencial de crescimento, especialmente no segmento de alto padrão. É preciso enfrentar desafios estruturais e aproveitar oportunidades de inovação. As perspectivas de futuro, especialmente no segmento de alto padrão, são bastante promissoras.
CI: Na sua opinião, qual a estratégia mais eficiente para gerir uma empresa independente?
Sheyla Resende: São diversas as estratégias utilizadas para desenvolver o modelo de negócio estabelecido, mas o principal é a combinação de foco em resultado e comprometimento, profissionais conectados com o propósito, DNA e cultura da empresa e um olhar cuidadoso para as pessoas, com forte atuação em desenvolvimento de talentos, reconhecimento e retenção.
Como CEO, entendo que o meu tempo de casa seja relevante, pois me permite ter uma visão ampla e holística do negócio e dos processos. Isso é um facilitador para que eu identifique as adequações e melhorias necessárias. Além disso, temos o cliente no centro do negócio e estamos sempre dispostos a aprender. Estudamos vários tipos de mercado, que não se limitam somente ao imobiliário, e utilizamos desse repertório para desenvolvermos e adaptarmos estratégias e planos de melhoria.
A Gafisa é uma marca muito reconhecida, são 70 anos de história, com relevantes números, como o seu portfólio que conta com mais de 1.200 empreendimentos entregues, mais de 16 milhões de m² construídos e ampla base de clientes. Esses números demonstram o impacto da Gafisa na vida das cidades e das pessoas. Continuar contando essa história, agora como gestora dessa empresa, é uma oportunidade enriquecedora, um presente.
CI: Você disse que estar realizada na vida social e pessoal é o que dá fôlego para uma vida profissional também de sucesso. Como se chega a esse equilíbrio?
Sheyla Resende: Na minha visão, é importante encontrar uma combinação para os diferentes papéis que nós desempenhamos. Para isso, é preciso organização, foco, dedicação e uma rede de apoio. Mas não há uma receita. Cada pessoa precisa encontrar seu caminho, buscando fazer tudo que deseja para alcançar seus objetivos e sonhos.
CI: Os resultados da Gafisa melhoraram na sua gestão? Quais dados você poderia compartilhar?
Sheyla Resende: O corpo executivo da Gafisa está formado por profissionais de alta performance. Isso é muito positivo, pois atuamos juntos, desde o desenvolvimento das estratégias até o acompanhamento da operação e desenvolvimento de pessoas. Nosso foco é melhorar a saúde financeira da companhia, aumentar a rentabilidade, reduzir despesas e investir em oportunidades de ativos que conversem com a nossa estratégia do alto padrão, com foco em São Paulo e Rio de Janeiro.
CI: Qual a importância do Rio Construção Summit para o Rio de Janeiro e para o setor da construção?
Sheyla Resende: É extremamente importante. É o maior evento do setor na América Latina. Hora de encontrar com todos os líderes da região, conversar e verificar o que está sendo realizado em termos de modernidade. Sempre há algum ponto que podemos aprender mais. Além disso, mostramos o que de melhor está sendo realizado na indústria nacional. É um momento de conexão, comunicação e reverberação do setor.
Ali, conversamos sobre os principais temas do setor, que vão do aumento da produtividade na cadeia até qualificação profissional, saúde e segurança do trabalho e responsabilidade social. Há fóruns também para debater pontos importantes, como as participações dos setores público e privado nos cenários nacional, regional e mundial da construção, além dos aspectos legais e de investimentos. É um acontecimento que repercute em nível internacional.
CI: Você diz que o trabalho de CEO exige adaptabilidade. Como é possível alcançar essa adaptabilidade?
Sheyla Resende: Sim, digo isso sempre. Ser CEO é uma posição em que estamos em constante aprendizado e sempre dispostos a nos adaptarmos ao novo, abertos a sugestões, melhorias. Precisa ter flexibilidade de pensamento para mudar quando for necessário, mas também é indispensável ser fiel a determinados valores e objetivos. Esse é um ponto de equilíbrio muito forte.