Câmera de filmagem, cinema, audiovisual

O DESTAQUE DO AUDIOVISUAL
DO RIO PARA O PAÍS


Indústria audiovisual fluminense representa 90% da bilheteria de filmes nacionais e sucesso de “Ainda estou aqui”, filmado no Rio, impacta setor

 

O recente prêmio de melhor atriz no Globo de Ouro para Fernanda Torres e as três indicações de “Ainda estou aqui” para o Oscar 2025, incluindo a inédita concorrência na categoria principal, são oportunidades únicas para o incremento da atividade no Brasil.

 

“Um prêmio desse, em que o mundo inteiro está falando da profissão de atriz, traz autoestima para o setor e para toda uma população. É um prêmio do Brasil! As famílias de jovens que querem seguir carreira no setor passam a apoiar mais essa escolha. E a indústria do audiovisual trabalha mais e melhor e eleva nossa importância para o mundo”, avalia Leonardo Edde, vice-presidente licenciado da Firjan e presidente da RioFilme.

 

“A premiação atrai mais investimentos, mais produções, abre os olhos do governo para a indústria. É o poder do soft power: como o Brasil está sendo falado de forma positiva no mundo. É um investimento pequeno que traz um retorno imenso”, pontua Edde.


O efeito do filme de Walter Salles, que mobilizou os brasileiros, com mais de 3,4 milhões de espectadores até janeiro, pode ser sentido também no Centro de Referência em Cinema e Audiovisual da Firjan SENAI SESI Laranjeiras. Prestes a iniciar mais um ano do único curso de Ensino Médio do Brasil 100% vocacionado para esse segmento, a Firjan SENAI Laranjeiras quer aproveitar essa retomada do público ao cinema nacional para incentivar jovens a frequentarem cursos ligados à indústria audiovisual.

 

 

A 1ª turma de Ensino Médio da Escola Firjan SESI + Técnico em Cinema e Audiovisual, pela Firjan SENAI, se formou em dezembro passado. Foram 127 alunos, que durante três anos aprenderam roteiro, direção, fotografia, design gráfico, áudio, câmera, produção e várias outras disciplinas, na teoria e na prática. Tudo isso aliado ao Ensino Médio regular gratuito.

 

A escola de cinema e audiovisual da Firjan SENAI SESI começou a ser planejada bem antes disso, num período em que a produção de filmes e séries estava aquecida e a indústria já sentia falta de profissionais capacitados. Edde fez parte do núcleo de criação do Centro de Referência, que foi inaugurado na pós-pandemia, em 2022.

 

“Foi uma das nossas maiores conquistas. Era uma necessidade da indústria de audiovisual a capacitação e formação de mão de obra qualificada. O audiovisual é uma das atividades que mais abre oportunidades de emprego para jovens até 29 anos. É inclusiva e diversa”, acrescenta.

 

A presidente em exercício do Sindicado Interestadual da Indústria Audiovisual (Sicav), Glaucia Camargos, compartilha da opinião de Edde e avalia que, para fazer um longa, são empregadas cerca de 300 pessoas em diversas funções.

 

“O Brasil em várias áreas, não só no audiovisual, tem despreparo grande de mão de obra. O curso da Firjan SENAI SESI consegue criar, independentemente das faculdades, uma política de mão de obra mais pragmática, uma capacitação que vai contribuir para a melhoria dos profissionais das produções. A iniciativa é de louvor extraordinário”.

 

 

O “Estudo de Demanda Profissional do Setor Audiovisual”, realizado no ano passado pela Firjan em parceria com o Sicav, revelou que 76,7% das empresas brasileiras desse segmento enfrentam dificuldade para contratar profissionais especializados. A carência é sentida num cenário de recuperação e crescimento do setor, com retorno de investimentos, que faz com que haja aumento da demanda por profissionais.

 

Glaucia conta que participou da produção do filme sobre Sérgio Malandro, que teve também estudantes do curso de Laranjeiras. Pela carência de profissionais qualificados, ela acredita que há interesse das empresas do setor de contratar os egressos do curso. “Isso vai estar ligado à expansão do mercado para as produtoras. Se amplia a produção, abre espaço para esses alunos. Temos feito um trabalho cada vez maior para divulgar esses formandos”.

 

Aluno em campo

 

O Centro de Referência se preparou para colocar no mercado multiprofissionais qualificados. Isso dá chance aos jovens de saírem do Ensino Médio e ingressarem no mercado de trabalho. Eles têm também a oportunidade de cursar uma universidade.

 

Uma das formandas da 1ª turma do Ensino Médio em Cinema e Audiovisual é Ana Luiza de Sant’Anna, 17 anos, que vai cursar Cinema na ESPM, após garantir uma bolsa de estudo integral.

 

“O curso da Firjan é maravilhoso e dá uma base muito grande para quem quer seguir na área como eu. Tive aulas de roteiro, produção, foto... Cada etapa do audiovisual é visitada, principalmente a produção. Produzimos e fizemos direção e roteiro de curtas. Aprendi também sobre produção de áudio e vídeo”, conta ela.

 

Durante todo o ano de 2024, Ana Luiza e outros dois colegas participaram da produção do longa “O que resta de nós”, do diretor e roteirista Rafael Castro Lopes, que também era seu professor na Escola Firjan SESI.

 

“Participei da produção dos cenários, ajudava nas filmagens, ganhei experiência. Foi incrível”. Para quem gosta dessa área, Ana Luiza aconselha: “Se você tem interesse, vale muito fazer o curso”.

 

Rafael Castro Lopes é outro entusiasta do curso. Ele é instrutor de teoria e prática de linguagem cinematográfica, direção, produção, roteiro, edição, direção de fotografia e divulgação, tanto no curso regular do Ensino Médio como nos de qualificação. Com 25 anos de experiência na área, fez graduação em Cinema em Portugal e pós-graduação na Espanha.

 

À direita, a formanda Ana Luiza, com o instrutor da Firjan SENAI, diretor e roteirista Rafael Castro Lopes (2º à esqu.) e a equipe de filmagem em ação (Foto: Arquivo pessoal)

 

“Importante dar oportunidade para essa garotada. A arte é uma grande terapia e o cinema é voz. No fim do curso vemos o empoderamento dos alunos. O Centro é bem completo, com equipamentos de última geração, com toda a infraestrutura de vários estúdios, inclusive de colorimetria, 15 câmeras, salas de edição”.

 

Os alunos que forem cursar uma faculdade entrarão com muito mais base, acredita Lopes. A formação os capacita para atuar em várias áreas além do cinema e da TV. Podem seguir a fotografia, se tornar um videomaker e trabalhar em empresas, voltados para redes sociais, ou mesmo de forma autônoma. Além do curso técnico atrelado ao Ensino Médio, o Centro de Referência oferece diversos cursos livres de qualificação e aperfeiçoamento.

 

Para o estágio em seu filme, Lopes selecionou três dos alunos mais interessados. “Precisava confiar que eles teriam responsabilidade, porque estavam atuando em uma produção profissional, e os três terão crédito no filme. Eles revezavam em operação de áudio, continuísta e produção. Como o filme é independente, os alunos preparavam luz, cenário, ajudavam os atores, como Stephan Nercessian e Silvia Buarque”.

 

O professor e diretor acredita que os recém-formados podem começar como estagiários, assistentes de câmera, áudio, entre outras tarefas. “O importante é entrar no mercado e focar em portfólio, ter um curta feito, por exemplo”, sugere.

 

 

Com a mão na massa

 

O Centro de Referência está se tornando cada vez mais conhecido e abrindo novas frentes. Já abrigou mais de sete pré-produções de filmes ou séries. Uma delas foi a do longa “Nosso Sonho”, sobre Claudinho e Buchecha, da produtora Urca. “Eles fizeram toda a pré-produção aqui, e a gente também trouxe um pouco dos nossos alunos pra dentro desse trabalho para poderem vivenciar esse ambiente mais profissional”, recorda Joselaine Rampini, gerente de Operações dos Centros de Referência Firjan SENAI SESI.


Em outra oportunidade, um grupo de 40 alunos foi assistir à apresentação da pré-estreia da minissérie sobre Ayrton Senna, em São Paulo. Alguns nunca tinham saído do Rio de Janeiro e tiveram a oportunidade de visitar a Netflix. Na ocasião, eles conheceram de perto a tecnologia “Virtual Production”.

 

As grandes empresas têm feito contato com o Centro de Referência e começam a costurar parcerias. “Então não é somente formar, mas o ideal é que a gente consiga fechar esse ciclo da empregabilidade”, diz Joselaine. Diretores das TV Globo conheceram as instalações do Centro e elogiaram os equipamentos e o trabalho desenvolvido.

 

Uma parceria com a RioFilme em 2024 rendeu qualificação profissional, a pedido de produtoras. “Os profissionais voltaram qualificados para as empresas. Então, temos diversas frentes aqui. Duas prefeituras do estado têm projetos para a criação de espaços de formação em audiovisual. No caso de Niterói, já assinamos um protocolo de intenções para montar uma escola na região da Cantareira. Outra atuação nossa é conseguir expandir a oferta de cursos em Audiovisual para todo o estado”, planeja Joselaine.

 

Além disso, departamentos regionais do SESI SENAI, como Paraná e Minas Gerais, procuraram a Firjan para conhecer o trabalho e ver formas de implantar unidades semelhantes nesses estados, e  o Conselho Nacional do SESI encomendou um documentário para ser feito pelo Centro de Referência.

 

 

Incentivos públicos

 

A indústria audiovisual recebeu recentemente uma injeção de ânimo com a sanção da Lei de Cotas de exibição de conteúdo nacional nos cinemas e na TV paga, conhecida como “cota de tela”. Por sua vez, a Lei Paulo Gustavo movimenta mais de R$ 2,7 bilhões no país. Estima-se que o setor contribua com mais de R$ 27 bilhões para o PIB brasileiro. Aliado a esses números, o levantamento “O impacto econômico do audiovisual na América Latina” (Netflix/Deloitte) prevê um crescimento anual de 7,2% da indústria audiovisual mundial até 2030.

 

Segundo Leo Edde, os filmes cariocas tiveram 90% do market share dos bilhetes vendidos de filmes nacionais no país em 2024. Por isso, é tão importante continuar investindo no audiovisual do Rio. Outro número positivo indica que a cidade do Rio de Janeiro superou Paris em número de filmagem nas ruas em 2023: foram 7.885 diárias no ano, contra 7,4 mil da capital francesa. Os dados são da RioFilme.

 

Ele acredita que o movimento surgido com “Ainda estou aqui” cria uma tendência de aumento da bilheteria para outros filmes nacionais. De fato, esse efeito já pode ser observado. O cinema nacional alcançou 30,9% do market share no país, neste início de janeiro, ante apenas 10% registrados ao longo de 2024, segundo a Agência Nacional do Cinema (Ancine).

 

“Mas a partir do momento em que o Estado pare de investir, ocorre um movimento contrário, porque haverá menos filmes nacionais a serem exibidos. A política pública está numa tendência de fragmentação dos investimentos. O pretexto é democratizar o acesso, privilegiando a quantidade, mais do que o impacto das obras criadas”, alerta Edde. Porém, argumenta ele, falta um planejamento federal de longo prazo sobre a distribuição e aplicação desses recursos, com o que a presidente do Sicav concorda.

 

O professor Rafael Lopes destaca o aumento de recursos em editais federais, estaduais e municipais. Ele mesmo está se inscrevendo para um edital voltado para distribuição de filmes. “Alguns editais privilegiam a pessoa física; e outros, as produtoras. Nestes casos, as maiores empresas acabam levando. Mas tem editais menores também. A concorrência é sempre boa, faz a gente melhorar”, finaliza.