

Publicado em 02/10/2025 - Atualizado em 02/10/2025 11:55
DESAFIO FEMININO
NO ESPORTE
Projetos como Esporte na Escola e Atletas do Futuro, da Firjan SESI, impactam comunidades em situação de vulnerabilidade e oferecem oportunidades a jovens
Larissa, 18 anos, Vivian, 16, e Lívia, 14, não se conhecem, mas percorrem trajetórias semelhantes. A primeira mora na Cidade de Deus e pratica jiu-jítsu; a segunda, no Andaraí, joga vôlei; e a terceira, de Duque de Caxias, destaca-se no basquete. Todas vivem em áreas com menos recursos da capital ou da Baixada Fluminense e participam de um dos projetos Esporte na Escola ou Atletas do Futuro, ambos da Firjan SESI.
No esporte feminino, a busca por espaço e reconhecimento é contínua, dado que a participação entre meninas e meninos nem sempre é balanceada. Hoje, nesses dois programas, 42% das vagas são ocupadas por mulheres – um sinal de avanço rumo à equidade de gênero.
O projeto Esporte na Escola, que em 2025 completa quatro anos de atuação, tem se firmado como uma ferramenta de transformação na vida de crianças e adolescentes em todo o estado. Vai além da prática esportiva, promovendo desenvolvimento de habilidades socioemocionais essenciais e atuando no combate ao sedentarismo e suas consequências físicas e psicossociais.
Já o Atletas do Futuro, com 15 anos de existência, utiliza o esporte para promover educação e inclusão social de crianças e adolescentes em aulas de iniciação motora e prática esportiva. Seus valores centrais incluem ética, trabalho em equipe, superação, respeito, autoestima e saúde. O projeto integra o Programa SESI Cidadania, buscando envolver indústrias parceiras tanto na implantação quanto nos resultados das atividades.
Autoestima e liderança
Carla Pinheiro, presidente do Conselho Empresarial de Mulheres da Firjan, ressalta a importância de oferecer oportunidades esportivas a meninas de contextos de vulnerabilidade, descrevendo o esporte como agente transformador capaz de romper ciclos de exclusão.
“Muitas jovens enfrentam barreiras sociais, econômicas e culturais que as afastam da prática esportiva. Criar oportunidades para essas meninas ingressarem no esporte é realmente transformador.”
Ela explica que o acesso ao esporte favorece o desenvolvimento da autoestima, liderança, disciplina e resiliência — competências que acompanham a jovem ao longo da vida. Além disso, o esporte exerce papel de proteção social, mantendo meninas menos expostas a contextos de violência, gravidez precoce e evasão escolar.


Como empresária e diretora da Firjan, Carla destaca também o potencial de mobilidade social: diversas atletas transformaram situações de vulnerabilidade em trajetórias profissionais ou acadêmicas de maior visibilidade.
“Quando meninas da periferia veem outras atletas alcançando sucesso, elas ganham inspiração e a crença de que também podem chegar lá — promovendo, além de saúde e lazer, justiça social, equidade de gênero e desenvolvimento humano.”
Qualificar para o esporte
Adriana Nogueira de Rezende, especialista em Saúde Integrada da Firjan SESI, comemora o crescimento do Esporte na Escola. Começou com 500 estudantes; hoje já são cerca de 900 em 15 unidades escolares Firjan SESI. As modalidades incluem vôlei, basquete, futsal, capoeira e ginástica artística, todas no contraturno escolar. Ela destaca a importância da formação contínua dos educadores envolvidos.
“Anualmente, nossos professores participam de capacitações que visam aperfeiçoar a metodologia adotada”, esclarece. Essas capacitações focam competências como colaboração, respeito, comunicação interpessoal, resolução de conflitos e liderança.
Outro diferencial é a participação dos alunos em etapas regionais e estaduais nos Amistosos do Esporte na Escola, competições que promovem intercâmbio esportivo entre unidades, fortalecendo espírito esportivo e camaradagem.
Valores além da quadra
No projeto, meninas aprendem habilidades atléticas, mas também criam vínculos, desenvolvem autoestima e se preparam para desafios futuros. A história de Vivian Uchôa, aluna do Esporte na Escola na unidade SESI Tijuca, ilustra essa trajetória de determinação.
Vivian ingressou no voleibol em 2022, quando estudava na Escola Municipal Epitácio Pessoa, no Andaraí, e participava do Atletas do Futuro. “Sempre tive um apego ao vôlei”, conta. Seu interesse surgiu em 2020 com aula experimental, mas só dois anos depois começou a se dedicar de fato.
Sobre profissionalização, Vivian relata que participou de seleções de base e jogou em clube, mas atualmente não joga em time por dificuldade de conciliar horários com os estudos. Mesmo assim, mantém o esporte vivo em sua rotina no Esporte na Escola.


Esporte para a vida
As histórias de Larissa Cristina dos Santos e Livia Laurentino reforçam que o esporte, em ambientes de apoio, pode ser decisivo não só para o desempenho atlético, mas para a formação integral. A jornada de Larissa Cristina dos Santos no jiu-jítsu começou no Atletas do Futuro, que trabalha com jovens de comunidades carentes, de 6 a 17 anos. Ela contou com o apoio fundamental da agente de cidadania Monique Vieira para se destacar no cenário feminino das competições, mostrando que, apesar das adversidades, o caminho é possível e gratificante.
"Entrei no projeto com 8 anos, trazida pela minha mãe", recorda Larissa, que desde então encontrou no jiu-jítsu uma paixão que iria moldar sua vida. Monique, que faz parte do projeto há seis anos, se lembra do primeiro encontro com Larissa e sua irmã gêmea. "Elas eram pré-adolescentes e já demonstravam potencial. Desde então, acompanhei seu crescimento tanto no esporte quanto na vida pessoal", lembra a agente de cidadania, que se tornou uma figura de referência e suporte para a jovem atleta.
A relação de Larissa com o esporte é intensa e cheia de conquistas. "Este ano, já ganhei dez medalhas, incluindo campeonatos estaduais e o Brasileiro", celebra a jovem, que não apenas se destaca nas competições, mas também lida com os desafios cotidianos que a vida traz. A perda da mãe, por exemplo, foi um dos momentos mais difíceis. "Esse projeto me acolheu, foi muito importante na minha vida", reflete a atleta, que destaca a importância do suporte emocional e psicológico recebido ao longo de sua trajetória.
Livia Laurentino, moradora de Duque de Caxias, quando estava no 7º ano do Ensino Fundamental, começou a participar do Esporte na Escola assim que soube da iniciativa. “Desde pequena, sempre gostei de basquete e achei que seria uma boa ideia tentar levar isso mais a sério”, conta, salientando que hoje não pensa mais em seguir uma carreira profissional, mas quer levar o esporte para a vida.


De várias formas o basquete acabou contribuindo para o crescimento de Livia. “O esporte não é só um hobby, mas um momento de foco, amizade, trabalho em grupo e aprendizado, no qual sempre temos ao longo do dia um ensinamento”, conta. Ela já participou de várias “peneiras” (seleção para uma vaga em times), mas também, por enquanto, optou por seguir no esporte apenas como amadora, contudo sem descartar a profissionalização mais adiante.
Dados e evidências recentes
Um estudo sistemático de queda de participação em esportes coletivos aponta que adolescentes do sexo feminino abandonam as atividades em taxas muito superiores às masculinas. Isso ocorre especialmente ao entrarem na puberdade, quando o esporte se torna mais competitivo, e quando o ambiente deixa de ser percebido como inclusivo.
Confira dados de estudos e estatísticas divulgados recentemente sobre o tema:
Segundo relatório da Unesco Game Plan (2024), 49% das meninas abandonam a prática esportiva durante a adolescência - uma taxa seis vezes maior do que a verificada entre adolescentes do sexo masculino. Os principais fatores apontados são falta de modelos femininos, insegurança, autoimagem negativa e preocupações com segurança.
A Women in Sport, no Reino Unido, identificou que 43% das adolescentes que se consideravam ativas esportivamente descontinuaram o esporte logo após o período primário (ensino fundamental), por razões como medo de julgamento, falta de autoconfiança, pressão escolar e sensação de insegurança no entorno.
Um estudo recente publicado por Frontiers in Sports & Active Living mostrou que meninas atletas que mantêm participação esportiva organizada apresentam níveis significativamente melhores de autoimagem corporal (body appreciation) em comparação às que deixam de participar. Isso sugere benefícios psicossociais concretos de longo prazo.
Outra pesquisa do Women’s Sports Foundation chamada Play to Lead (2024) evidencia que a participação esportiva na juventude tem impacto geracional no desenvolvimento de liderança em mulheres adultas - competências como assertividade, trabalho em equipe e senso de agência são reforçadas desde cedo.