Bernard Appy fala sobre Reforma Tributária

REFORMA TRIBUTÁRIA
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Ganhos, limitações e incertezas sobre a Reforma Tributária foram discutidos por Bernard Appy, secretário Extraordinário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, durante o evento “Desafios da Reforma Tributária – Como se preparar para as novas regras”, realizado pela Firjan em parceria com a Editora Globo, para mais de 240 pessoas, em 23/06. O secretário alertou, na sede da federação, sobre a necessidade de as empresas se prepararem para a transição, sobre o impacto no crescimento econômico e a correção de distorções que o novo sistema tributário deve trazer.

 

As configurações do novo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que vai substituir o ICMS e o ISS; e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que ficará no lugar o PIS-Cofins, foram detalhadas pelo secretário.

 

Acompanhe os principais tópicos abordados por Bernard Appy.

 

Melhorias do novo sistema tributário

 

A Reforma Tributária é necessária porque chegamos, no Brasil, em um grau de distorção no sistema de tributação, de produção, comercialização e consumo de bens e serviços absolutamente monumental. Com o efeito do nosso sistema atual de tributação, em função das inúmeras diferenças de regras entre setores, entre empresas, em função da guerra fiscal, chegamos em um grau de distorção que acaba tendo um resultado muito negativo para o potencial de crescimento da economia brasileira. O Brasil, provavelmente, tem um sistema mais complexo de tributos indiretos, sobre a produção, comercialização e consumo de bens e serviços. E essa complexidade gera custo para as empresas e muitas vezes gera litígio.

 

O nosso sistema tributário, por uma série de falhas, tributa os investimentos, as exportações, a produção nacional e os produtos importados. Ao tirar a competitividade da economia brasileira, você deixa de desenvolver setores que poderiam ser competitivos internacionalmente. Nosso sistema tributário distorce a forma de organização da produção. No Brasil, você não monta um centro de distribuição onde o custo de logística é menor. Você monta onde o benefício fiscal é maior, aumentando o custo de logística.

 

Mudanças visam corrigir distorções

 

O país está migrando para o padrão internacional de tributação da produção e consumo de bens e serviços, que é um imposto sobre valor adicionado, que tem algumas características: uma base ampla de incidência, sem discriminação entre bens e serviços, atingindo, inclusive, os bens imateriais. A tributação no destino pode ser entre estados, entre municípios, entre países. Todo tributo incidente nos bens e serviços adquiridos no processo produtivo de uma empresa é recuperado na forma de crédito, num sistema de débito e crédito, e com as regras mais simples possíveis.

 

Impacto sobre o crescimento econômico

 

Os estudos mostram o efeito entre quatro pontos percentuais e seis pontos percentuais de aumento do PIB potencial do Brasil por conta apenas da eliminação da oneração dos investimentos, sem a perda de competitividade da produção nacional. Mas os efeitos são muito maiores, por conta da simplificação e da eliminação das distorções na forma de organização da produção. Assim, o impacto sobre o potencial de crescimento do país, ou seja, sobre o PIB potencial, deve ficar entre 10 e 20 pontos percentuais. A maior parte desses efeitos deve aparecer em 15 anos. A previsão é que cada brasileiro tenha um poder de compra 10% maior e o lucro das empresas seja 10% maior do que seria sem a Reforma Tributária.
 

Palestra de Appy na Firjan
Secretário Bernard Appy fala, em evento na Firjan, sobre os desafios da Reforma (Foto: Paula Johas)


Preparar para a transição

 

Quem depende apenas de benefício fiscal para ser competitivo, talvez não se dê tão bem com a Reforma. Mas quem é eficiente vai se dar bem. A mudança vai selecionar aqueles mais eficientes. Assim, a economia cresce mais, e o país como um todo ganha. É importante que as empresas comecem a se preparar para essa transição, que afeta seu modelo de negócio. É preciso começar a pensar nos contratos com efeito para além de 2027. Será necessária a renegociação de preços com fornecedores, com clientes. Hoje os tributos incidem sobre o preço com tributos, agora vão passar a incidir sobre o preço sem tributos. Em 2026 não haverá cobrança de Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Todas as empresas terão no próximo ano acesso ao novo sistema para se acostumar a ele.

 

Alíquota padrão

 

Com os novos impostos, não haverá aumento da carga tributária. A CBS, a contribuição federal que vai substituir o PIS-Cofins; e o IBS, que vai substituir o ICMS e o ISS, serão fixados de forma a manter a carga tributária em proporção ao PIB. Acho que esse é o ponto superior.

 

A nossa estimativa hoje seria uma alíquota padrão próxima de 28% em função das muitas exceções que foram incluídas durante a votação, o que faz parte do processo democrático. Agora as pessoas vão saber quanto estão pagando de tributos em bens ou serviços e vão poder discutir. Isso é bom para a cidadania fiscal.

 

Direito a crédito

 

Hoje o grau de contencioso e de litígio que existe sobre matérias tributárias no Brasil é brutal. Sendo que, no caso do ICMS e do PIS-Cofins, a grande maioria é por conta do direito a crédito. Na Reforma Tributária tudo dará direito a crédito, exceto aquilo que nós chamamos de bens de uso e consumo pessoal.

 

Uma empresa que tem estabelecimentos em dez estados, hoje, costuma ser tributada nesses dez estados. Com a Reforma, a apuração será uma única vez, mesmo que existam filiais em vários estados.

 

Basicamente, a obrigação da empresa vai ser emitir o documento fiscal eletrônico na venda, fazer todas as aquisições com documento fiscal eletrônico e registrar o que dá direito a crédito, que é tudo, exceto aquilo de uso do consumo pessoal. Dessa forma, o sistema de apuração facilita a vida das empresas.

 

O modelo todo está sendo feito para que haja impacto mínimo na liquidez das empresas. Por exemplo, faço uma venda de R$ 100, o tributo é R$ 20. Então, R$ 80 é a parcela do fornecedor; e R$ 20, dos tributos. A ideia é reter isso na liquidação financeira, mas se esse fornecedor já tem débitos liquidados, por apropriação de crédito, esse valor não será retido, ele será automaticamente transferido para o fornecedor.

 

Redução de fraudes

 

A ideia também é reduzir a fraude porque no Brasil há um problema enorme de nota fiscal fria. O modelo está sendo feito para valorizar o bom pagador em detrimento do mal pagador. No momento em que reduzo a sonegação, a alíquota fica menor, porque se eu tiver menos sonegação, menos inadimplência, menos fraude, vou ter uma alíquota menor para manter a arrecadação no nível atual. Queremos a menor alíquota possível, sendo uma parte via redução de fraudes e de sonegação.

 

Impacto sobre estados e municípios

 

A discussão da Reforma Tributária tem sua trajetória no Parlamento. Falta a aprovação do PLP 108/2024 no Senado,, que regulamenta a gestão e a fiscalização do IBS, que vai substituir o ICMS (estadual) e o ISS (municipal). Depois, a Câmara terá que aprovar ou rejeitar as mudanças feitas pelo Senado. Acredito que não vai contaminar a discussão das outras questões da Reforma.

 

O impacto da Reforma Tributária sobre as finanças de cada estado e de cada município está extremamente diluído no tempo. Estamos falando em 50 anos de transição da distribuição atual da receita entre entes federativos para aquela que resulta da Reforma. Isso não afetará as empresas, cuja transição termina em 1º de janeiro de 2033. A partir daí, não tem mais ICMS, ISS, PIS-Cofins.

 

Desigualdades regionais

 

A Reforma Tributária tem impacto positivo de redução das desigualdades regionais. É importante entender isso. A troca dos benefícios fiscais como instrumento de desenvolvimento pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional tem impacto positivo no progresso das regiões menos desenvolvidas do país, claramente, porque hoje todos os estados dão benefício fiscal, e o fundo nacional vai gerenciar melhor os estados menos desenvolvidos da federação. Por isso, o novo instrumento é mais eficiente e vai contribuir para reduzir as desigualdades regionais.

 

A migração da tributação para o destino e a unificação da base de incidência vão diminuir as desigualdades. Se há um município cuja renda per capita é 15 vezes maior do que a do outro, hoje a distribuição da receita pode dar uma diferença de 200 vezes entre eles. Essa diferença vai cair para 15 vezes com o efeito final da Reforma.

 

No evento, foi lançada a Cartilha da Firjan, onde é possível encontrar todos os detalhes do novo sistema tributário.