Fernanda Hipólito e o filho Felipe na padaria Flor da Tijuca

SUCESSÃO EMPRESARIAL
REQUER PLANEJAMENTO


O planejamento da sucessão na indústria, principalmente em empresas familiares, é de suma importância para a continuidade dos negócios. Questões societárias, tributárias e de gestão fazem parte dessa jornada que pode começar antes da ausência, por morte ou não, dos fundadores e presidentes de empresas. A Firjan IEL e o CIRJ já auxiliam os empresários nessa missão. 

A seguir três casos de empresas familiares que já começaram a planejar a sucessão. 

Padaria Flor da Tijuca 

Fernanda Hipólito é presidente do Sindicato da Indústria de Panificação e Confeitaria do Município do Rio Janeiro (Rio + Pão) e dona das padarias Flor da Tijuca e Panetteria São Francisco, além do Gaia Buffet e do Odara Catering, que formam um grupo econômico. Mesmo sendo uma empresária ainda jovem, já está preparando sua sucessão. O escolhido é o filho mais novo, Felipe, que cursa o 6º período de administração de empresas. 

“Ele poderá vir para o negócio com outro olhar. Por detestar números, me formei em comunicação social e trabalhei 12 anos como jornalista. Sou filha única e quando meu pai, Joaquim Palhete, ficou doente, pediu que eu assumisse. Se eu não aceitasse, o negócio acabaria. Infelizmente, meu pai faleceu em 2007, pouco depois que eu entrei na empresa. Já estou há quase 20 anos à frente das padarias”, conta Fernanda. 

 

Segunda e terceira gerações na Padaria Flor da Tijuca: Fernanda já se aconselha com o filho, Felipe, que está se preparando para administrar os negócios da mãe (Foto: Arquivo pessoal)

 

Garantia de continuidade 

A Firjan CIRJ apoia os empresários nessa jornada da sucessão e acredita que o planejamento sucessório na empresa familiar é fundamental. Estudos recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) constataram que 90% das empresas brasileiras são familiares, empregam 75% da mão-de-obra nacional e representam 65% do PIB. 

“O que chama a atenção é que, segundo o Banco Mundial, apenas 30% das empresas familiares chegam até a terceira geração e apenas metade delas sobrevive. Situação que poderia ser mitigada por meio de boas práticas de planejamento sucessório, com os herdeiros sendo preparados para assumir o negócio” afirma Bruno Barros, gerente geral Jurídico da Firjan. 

Contrariando as estatísticas do Banco Mundial, Felipe Hipólito, quando assumir o grupo de panificação da família, será a terceira geração. Ele tem o gosto pelo negócio, uma veia empreendedora grande, segundo Fernanda. “Eu me aconselho com ele em algumas questões na área financeira, por exemplo. Já participa de reuniões na empresa e sugeriu a mudança do escritório da padaria para outro prédio, onde também abrimos uma sala para capacitar os funcionários. O futuro administrador está à frente do planejamento estratégico das empresas”, detalha Fernanda. 

Por ter empresas rentáveis, consolidadas há mais de 60 anos, Fernanda se preocupa em preparar a sucessão familiar. “Precisamos continuar a prestar serviços, melhorar e até aumentar a rede. Para gerir o negócio, vale muito à pena investir em capacitação e desenvolvimento, para saber administrar bem e trabalhar com pessoas”. 



 

Fernanda acredita ter “DNA para o negócio” e reconhece a liderança conquistada. Não deu tempo do pai lhe ensinar. “Trabalhei junto com quem já estava na loja, convidei outras pessoas e fui aprendendo na marra. Quando senti necessidade de me capacitar, procurei instituições como a Firjan e conversei muito com empresários amigos”.  

Na época do pai, dono de padaria só vendia pães. Hoje, precisa entender de marketing, tributação, entre outros temas, e enfrentar grandes desafios. Tem que fazer conexões, indo além da venda do produto, conta ela, que usou seu olhar feminino para mudar todo o layout da loja e implantar o autosserviço e a escuta ativa dos clientes. 

A marca passou por um rebranding, focando também nos jovens. “Quero ser importante para a comunidade e para o meu bairro. Somos uma indústria de transformação. Nossa obrigação é ter o melhor pão e estar na casa do cliente também nas comemorações com os outros produtos”. 

O início da liderança sindical foi através do presidente do Sindicato Rio + Pão, na época, Armando Vieira da Cruz, 80 anos, que a chamou para ser vice na chapa dele. Mas Armando morreu dois meses depois da eleição. Assim, ela assumiu mais esse desafio. 

Outra lição que pretende passar para Felipe é a importância de ser líder. “Ele tem 21 anos e deve se formar em até dois anos, quando deve assumir o cargo de diretor administrativo e financeiro. Mas o importante é estar sempre na linha de produção”. O filho mais velho, Victor, é publicitário e trabalha em uma agência, mas participa do grupo de marketing da empresa. 



 

Sucessão planejada 

O planejamento sucessório em empresas familiares pode ser feito em etapas, de acordo com Bruno Barros. “É preciso ter uma definição clara da estrutura da propriedade e da empresa e de que forma são tomadas as decisões. Se necessário, deve-se fazer uma revisão do contrato social, podendo ser feito, inclusive, um acordo entre acionistas sobre as diretrizes de compra e venda de ações”, recomenda. O advogado explica que há famílias que criam uma holding familiar, porque, pelos aspectos tributários, é possível reduzir assim o custo de impostos. Pode ser feita doação de cotas, com cláusulas de usufruto, ensina.

 

A Firjan CIRJ e a Firjan IEL têm papel vital no suporte aos empresários associados sobre questões de sucessão. É uma variedade de serviços como assessoria e consultoria tributária, além de promoção de eventos e fóruns de discussão nos quais os empresários dividem suas dúvidas. Há ainda no portfólio para líderes, da Firjan IEL, cursos e oficinas que capacitam lideranças empresariais e gestores de Micro, Pequenas e Médias Empresas em temas relacionados à Gestão, Produtividade e Inovação. A assessoria jurídica ajuda também na alteração estatutária. 

A Firjan IEL vem realizando a Oficina Sucessão em Empresas Familiares em parceria com o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). Em julho foi realizada em Nova Friburgo e a próxima turma será em 07/11, em Petrópolis. Nesta oficina, serão abordados conceitos de: governança corporativa e familiar; desafios da governança em empresas familiares e o processo de sucessão, incluindo orientações para planejamento, preparação e execução da sucessão. Ao final da oficina, que tem carga horária de 8 horas, os membros das famílias empreendedoras serão sensibilizados a implementar boas práticas de governança corporativa.

 

Participantes do curso de formação para conselheiros, promovido pela Firjan IEL, que tratou também do tema sucessão empresarial: a federação oferece serviços, oficinas e cursos para líderes que planejam sua sucessão (Foto: Firjan)

 

Nesta oficina, o investimento contempla a inscrição de até duas pessoas da mesma empresa, com valor diferenciado de até 70% para empresas associadas. Já a Associação dos Joalheiros e Relojoeiros do Estado do Rio (Sistema Ajorio, do qual faz parte o Sindijoias) vai promover o XI Seminário Atualização Tecnológica e o Setor de Joias e Bijuterias, na Casa Firjan, em 8/11, e uma das temáticas será sucessão e governança na micro e pequena empresa.

 

Bruno salienta que há ainda o aspecto psicológico da sucessão. “Enquanto o fundador está vivo, é um empreendedor, consegue conciliar conflitos familiares e participa da solução. Por isso, não se deve esperar a saída do líder para começar a transição. Atribuir responsabilidades de forma objetiva é importante para a família e os empregados, mantendo um ambiente adequado de convívio”, orienta. 

 

Terceira geração: Silvia Lantimant, presidente do Conselho da Granfino,  prepara o filho, Felipe, para assumir a empresa (Foto: Arquivo Pessoal)


Granfino também se prepara 

O administrator fundador não precisa se afastar para iniciar a sucessão. É importante estar presente para ser o mentor do novo líder. Vai facilitar que o novo presidente seja reconhecido pelos trabalhadores. É o que tem feito Silvia Lantimant, presidente do Conselho da Granfino, que prepara o filho, Felipe, para assumir a empresa. 

Silvia e os primos foram criados dentro da fábrica, aprendendo com os pais, como trabalhar. “Eles deixaram uma espécie de manual de instrução, que está dando certo. Descendentes de portugueses, também tinham princípios rigorosos do comércio. Meu pai, Silvio Coelho, era líder desde pequeno”. 

A Granfino tem 73 anos e foi comprada pela família Coelho em 1963. Era uma empresa pequena, no centro de Nova Iguaçu, que produzia fubá e farinha. A família chegou a 30 supermercados na Baixada e no Rio. Com o conhecimento do comércio, os irmãos Coelho transformaram a Granfino numa grande indústria. Silvio foi também diretor e fundador da Firjan Nova Iguaçu e Região. Atualmente, Renata Coelho, filha de um dos tios, é presidente da empresa, outro primo é diretor Industrial e outro, diretor de Compras. 

“Quando assumi, há 40 anos, não era muito comum a mulher liderar. Antes de trabalhar na Granfino, recém-graduada em direito, meu pai mandou que eu assumisse uma confecção em dificuldades financeiras. Fui aprender na prática a trabalhar numa fábrica. Em oito anos, recuperei a empresa e a vendi e meu pai me chamou para a Granfino”. 

A empresa vai passar pela transição da terceira geração. Agora é a vez de Felipe Coelho Lantimant, filho de Silvia, que se formou em design gráfico e marketing. Ela seguiu o exemplo do pai e o mandou trabalhar em outras empresas. “Vai aprender a ser empregado, ter horário, responsabilidades fora da asa da mãe. Já estava há 10 anos no mercado e meu pai o chamou para assumir a área de marketing”. Ele repaginou toda a Granfino: imagem, marketing e está há 20 anos na empresa. Atualmente é diretor de Marketing. 

“Não sei quando a sucessão será feita, mas está encaminhada. O futuro não dá para saber, mas ele está sendo preparado para a sucessão”, declara Silvia. Nenhum sobrinho se interessou pela empresa. Meu pai trabalhou até os 96 anos e morreu dentro da fábrica, após sentir uma tonteira. Meus tios também trabalharam até o fim”. 

“Não me vejo aposentar algum dia. Não sei se esse dia vai chegar. Hoje faço um voo por cima. Mas vou todo dia à Granfino”. Silvia diz que é importante ter liderança e os outros a aceitarem como líder. “Eu sou conciliadora, tento resolver os problemas. Minha formação em direito, me ajudou muito na empresa”. 

 

Na Art Lev, Carla Pinheiro sonha em ter o filho, Breno, na administração dos negócios no futuro (Foto: Arquivo Pessoal)

 

Art Lev avalia sucessão 

Mesmo quem ainda não iniciou o processo sucessório, já pensa no assunto, tomando por base sua própria história de empresária. Formada em engenharia elétrica, com ênfase em eletrônica de sistemas, Carla Pinheiro trabalhava no mercado financeiro em São Paulo, quando foi chamada pelo pai para ajudar na fábrica de joias que ele recebera como pagamento de uma dívida. 

“Toda a família tinha DNA de comércio, e não de indústria, e achava que eu, por ser engenheira, deveria entender de fábrica. Acabei entrando na fábrica. Investi em novas tecnologias, design de produtos e começaram a me seduzir para assumir o negócio. Hoje tento incentivar meu filho, Breno, de 18 anos, a se interessar pela nossa empresa, a Art Lev”. 

“Meu pai, Carlos Alberto Pinheiro, imigrante português, trabalhou numa loja de joias, no Centro do Rio. Com as economias, montou um atacado que supria as lojas. Ele investia numa indústria de joias que quebrou e foi dada a ele como pagamento das dívidas”, explica. 

Quando o pai de Carla faleceu, aos 84 anos, seus dois irmãos voltaram para o comércio, que é o DNA deles. “Atualmente sou a proprietária única da indústria Art Lev. Um dos meus tios montou um atacado de joias. Quando entrei para a empresa, cada filho tinha seu lugar definido. Eu era a única mulher e caçula. Investi em visita a feiras internacionais para conhecer novas tecnologias”, lembra. Ela fez capacitações e aprendeu no dia a dia. Um dos cursos foi o de formação para conselheiros da Firjan IEL, que tratava também de sucessão.   

Hoje a empresa produz sob encomenda para atacados e varejistas. Quando assumiu, Carla introduziu várias mudanças, investiu em design nacional e abandonou a cópia de joias italianas. 

“Foi muito difícil ter uma mulher entrando numa empresa com três homens. Brincavam que eu ia deixá-los pobres. Havia conflitos geracionais e de gestão, mas meu pai pacificava os conflitos entre os filhos”, conta. A empresária também é presidente da Ajorio e do Sindicato das Indústrias da Joalheria e Lapidação de Pedras Preciosas do Estado do Rio de Janeiro (Sindijoias) e do Conselho Empresarial de Mulheres da Firjan. 

A sucessão está sempre na mente de Carla, que espera que o filho assuma a empresa futuramente, mas não há certezas. Jovem ainda, o rapaz quer estudar direito, mas também pensa em se envolver no negócio das joias. Já os dois sobrinhos não se interessaram, um trabalha em telecomunicações e outro é músico. Carla espera iniciar o processo sucessório de forma planejada, se possível.